Intervenção inicial do presidente José Manuel Silva | Reunião de Câmara, 16 de outubro

O presidente da Câmara Municipal (CM) de Coimbra, José Manuel Silva, dedicou a sua intervenção à nova Casa da Cidadania da Língua, inaugurada na passada semana. A cerimónia de inauguração da Casa da Cidadania da Língua contou com a presença do presidente do Senado Federal do Brasil, Rodrigo Pacheco, que antes viu-lhe ser atribuída a medalha de ouro da cidade de Coimbra. Nesta ocasião, destacou a importância de se celebrarem as pessoas que falam a língua portuguesa. José Manuel Silva destacou o discurso de Rodrigo Pacheco, referindo que resume de forma “brilhante” o espírito da Casa: “Admitir a cidadania da língua como premissa significa reconhecer, no idioma, o poder de acolher, de unir as pessoas, de tecer narrativas, de despertar empatias.

 

Admitir a cidadania da língua como premissa significa reconhecer o papel do ensino da língua, das artes, da educação e da cultura em aproximar as sociedades — e trabalhar por esse ideal”.

 

 

Intervenção na íntegra:

 

«A inauguração da Casa da Cidadania da Língua foi um êxito notável, um grande convívio da Língua Portuguesa, com apreciável repercussão mediática, o que é muito importante para a afirmação, reconhecimento e orgulho de Coimbra. Recordando Chico Buarque, foi bonita a festa, pá; foi regada uma semente de Cidadania, com cheirinho de alecrim, num canto do belíssimo jardim.

 

A Coimbra, onde José Bonifácio de Andrada e Silva, considerado como o Patriarca da Independência do Brasil, viveu, estudou e lecionou com brilhantismo, vieram cinco senadores brasileiros, entre os quais o presidente do senado federal do Brasil, Rodrigo Pacheco, a terceira figura de Estado na linha de sucessão presidencial do Brasil, muito justamente homenageado com a medalha de ouro da cidade de Coimbra.

 

Inúmeras individualidades engalanaram a emotiva cerimónia com a sua presença, mas quero salientar e agradecer a presença dos embaixadores de Portugal no Brasil e do Brasil em Portugal, o embaixador do Brasil junto da CPLP, a deputada moçambicana para a Europa e o resto do mundo, o presidente da Casa de Portugal em S. Paulo, o Desembargador Marco Antônio Marques da Silva, a Gerente da Assessoria de Relações Internacionais do SESC de S. Paulo, o Presidente da Câmara de Comércio Luso Brasileira, a escritora Luiza Romão, vencedora do prémio Jabuti com a obra “Também Guardamos Pedras Aqui”, Chico Diaz Rocha, um conhecido ator mexicano-brasileiro, entre muitas outras pessoas de múltiplas nacionalidades.

 

Rodrigo Pacheco proferiu um discurso brilhante e eloquente na inauguração da Casa da Cidadania da Língua, pelo que vou referir com imenso prazer algumas das suas passagens:

 

“A língua portuguesa, antes instrumento de dominação, hoje em dia traz em si desejo de irmandade, de equivalência. Reflete a identidade da lusofonia contemporânea, do projeto da Comunidade de Países de Língua Portuguesa, a CPLP.

 

Nós, países lusófonos, já não somos império e colônias. Somos países amigos, países parceiros, países irmãos.

 

A língua portuguesa é o oceano que todos compartilhamos. A língua portuguesa é património da Humanidade, e somos todos filhas e filhos da Humanidade….

 

Pois a iniciativa que hoje inauguramos, esta Casa da Cidadania da Língua, é marcadamente política. Ela surge como a filha do eu-lírico de Conceição Evaristo: recolhe e traz à tona “as vozes mudas, caladas, engasgadas”.

 

Nesse contexto, nossa missão não é mais a de celebrar a língua portuguesa em si mesma, mas a de celebrar as pessoas que falam essa língua.

 

Nossa missão não é mais a de homenagear as diferentes pátrias que adotam o português, mas a de valorizar os povos que compõem essas pátrias….

 

Admitir a cidadania da língua como premissa significa reconhecer, no idioma, o poder de acolher, de unir as pessoas, de tecer narrativas, de despertar empatias.

 

Admitir a cidadania da língua como premissa significa reconhecer o papel do ensino da língua, das artes, da educação e da cultura em aproximar as sociedades — e trabalhar por esse ideal….

 

O esforço que temos feito para aproximar nossas culturas tem dado excelentes resultados — como vimos nas comemorações do bicentenário da Independência do Brasil, com os projetos “200 anos, 200 livros” e “Casa da Cidadania e da Língua”.

 

Quero, então, concluir minha fala fazendo votos para que esta iniciativa sirva não só cidadãos de Brasil e Portugal, mas de todos os países lusófonos — e de outros países também.

 

Que nossas trocas sejam cada vez mais intensas; nossos laços, cada dia mais fortes; e que nossa língua comum aproxime cada vez mais as nossas culturas e as nossas pátrias.“  Fim das citações.

 

Eu diria que, do que é relevante, está quase tudo dito. A ‘Casa da Cidadania da Língua’ está bem justificada e homenageada.

 

Porém, agora que este processo inicial terminou, não posso deixar de proferir livremente alguns comentários, começando por recordar, elogiar e agradecer a Carlos Encarnação, pela ideia, pela iniciativa e pela forma como conduziu com êxito o longo processo de criação da Casa da Escrita, desde que a aquisição aos herdeiros de João José Cochofel, em 2002, até à sua inauguração como Casa da Escrita, em 2010, depois de um extraordinário projeto de recuperação, da autoria do arquiteto João Mendes Ribeiro.

 

Vale a pena recordar as palavras de Eduardo Lourenço na inauguração da Casa da Escrita: “Foi nos meus 19, 20 anos que conheci esta casa. E foi pela mão de Carlos de Oliveira que entrei em contacto com este grupo do Novo Cancioneiro. Esta casa foi o castelo de sonhos de toda uma geração que não aceitava a realidade só por ser realidade e que pensava que o mundo precisava de ser alterado, modificado, desconstruído”.

 

Na verdade, esta casa nunca preencheu sequer a sua finalidade de ser uma Casa da Escrita, nem correspondeu ao desejo da então ministra da Educação, Isabel Alçada, de que pudesse ser “um palco “privilegiado” de “interação entre as escolas e as atividades pedagógicas ligadas à escrita e à leitura”.

 

Quando tomámos posse há dois anos, a Casa estava absolutamente letárgica e a precisar urgentemente de manutenção e, durante este tempo, nenhuma outra associação do concelho nos apresentou algum projeto para a mesma, que fique bem claro.

 

Devo dizer, no entanto, que, na sequência de uma conversa casual, e por minha sugestão, recebi um email pessoal com uma interessante proposta, há cerca de 10 meses, que não chegou a ser explorado pelas modificações entretanto verificadas no Departamento de Cultura, mas que não esqueci.

 

Assim, quando recentemente a associação Portugal Brasil 200 anos propôs o conceito da ‘Casa da Cidadania’ da Língua, acolhemos a sugestão com entusiasmo, com o mesmo raciocínio que nos levou a abraçar o projeto TUMO, pela imediata perceção do seu enorme potencial, atualidade e capacidade agregadora, com a clara convicção de que estamos verdadeiramente a honrar o Castelo de Sonhos de Eduardo Lourenço, a respeitar aquilo que realmente foi a casa de artistas, literatura, tertúlias e subversão de João José Cochofel, a concretizar a visão de Fernando Pessoa, quando o desassossegado Bernardo Soares afirmou que “a minha pátria é a língua portuguesa” e a ser realmente uma “uma casa aberta a todos”, como preconizava o seu primeiro curador, o Prof. Seabra Pereira.

 

Tudo isto está na linha do que o presidente da Associação Portugal Brasil 200 Anos, José Manuel Diogo, frisou durante a inauguração da casa da Cidadania da Língua, que a casa será um espaço para “debater, estudar, abrir fronteiras e criar uma nova relação entre os países de língua portuguesa”. “Um espaço para associações, editoras, governos, jornalistas, intelectuais e artistas, em que o intercâmbio de ideias, conhecimentos e experiências trará mais força aos laços entre os países de língua portuguesa”.

 

Por tudo isto, estranhámos algumas reações violentas e até insultuosas a este projeto inovador, desafiante e mediático, um projeto internacionalista de cultura e de cidadania, que coloca Coimbra no epicentro do debate em torno da Cidadania da Língua.

 

Ao contrário do que acontece com outras associações que gerem espaços culturais da Câmara, foi aprovado um protocolo de co curadoria que não inclui qualquer exclusividade de utilização nem efetua transferências financeiras para gestão da APBRA, protocolo este aprovado publicamente de acordo com as regras da democracia e de forma transparente, depois de devidamente escrutinado e conferido pelos competentes departamentos da Câmara Municipal.

 

Recordamos ainda que o trabalho da APBRA foi publicamente elogiado pelo presidente do Senado Federal do Brasil e que a associação organizou um ciclo relativo à Cidadania da Língua na Feiro do Livro de Coimbra deste ano, de qualidade unanimemente reconhecida, que, por exemplo, trouxe pela primeira vez a Portugal, a Coimbra, a filósofa política e ativista brasileira Djamila Ribeiro, que já foi considerada pela BBC como uma das 100 mulheres mais influentes do mundo. São inequívocos selos de qualidade.

 

Esta é a nossa forma de trabalhar com a sociedade de Coimbra. Exatamente com o mesmo espírito congregador com que organizámos o ‘Verão a dois Tempos’, que também foi um êxito, estamos abertos a colaborações e parcerias com as associações culturais e escolas do concelho e, muito em particular, com a UC e a FLUC, parceiros que consideramos indispensáveis. Só conjugando esforços e iniciativas seremos mais dinâmicos, abrangentes e intensos e Coimbra irá mais longe. Todas e todos são necessários e bem-vindos. A nós não nos faltam trabalho e desafios de Programação no Convento São Francisco.

 

Que todos os falantes da língua de Miguel Torga, José Craveirinha, Jorge Amado, Pepetela, Arménio Vieira e tantos outros prémios Camões sintam a Casa da Cidadania também como sua, como a nossa casa comum, e que a vivenciem, que a visitem e que tragam iniciativas e reptos de todos os países de língua portuguesa.

 

Fomos eleitos para mudar e acelerar Coimbra, num conceito dinâmico de cidade CulTec, cosmopolita, aberta ao mundo, às pessoas, às artes, à cultura, à inovação, às novas ideias, à diferença, ao investimento, ao empreendedorismo, ao desenvolvimento e à criação de emprego. É isto que interessa às pessoas de Coimbra, e é exatamente o que estamos a fazer e iremos continuar a fazer. Como em outros campos da governação desta Câmara, estamos no bom caminho.

 

A Cidadania da Língua venceu a demagogia e a falsídia de alguns.»

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